Um Olhar de Fé:
O tempo e o barco
Vivemos –
mas nem todos – marcados pelo tempo que se mede pelo cronômetro: o relógio. Nem
todos, porque em muitos lugares o tempo é outro.
Assim é
entre os povos indígenas e as circunstâncias da nossa Amazônia. O tempo não é
medido pela pressa ou urgência, mas pelo ritmo das águas e da paciência.
Uma
experiência interessante é fazer uma viagem, de barco, pelos rios amazônicos.
Eu fiz está jornada neste mês de julho. Subi o Rio Negro, maior afluente do
Amazonas, que nasce na Colômbia e na Venezuela, seguindo de Manaus a São
Gabriel da Cachoeira. São mais de mil quilômetros.
Nosso barco
era expresso – a jato. Para começar, saímos uma hora e meia depois da hora
prevista. Lotação completa: 120 passageiros carregados de pertences e
mercadorias.
Era uma
“barca de Noé”. Fomos nos conhecendo – tínhamos tempo. Uma professora da
lingüística da USP (Universidade de São Paulo), que, acompanhada de dois
alunos, iria fazer uma pesquisa de campo, numa das 23 línguas existentes na
região que abrange a Diocese de São Gabriel da Cachoeira. Um deles estava muito
agitado e impaciente, porque seu tempo era o relógio.
Uma família
de americanos – casal e dois filhos entrando na adolescência – que estavam indo
para implantar uma agência turística, ecológica, e, quiçá, chegar ao Pico
Neblina. E estavam acompanhados por um cachorro, que vinha na suja gaiola, mas
que teve que viajar em cima do barco.
Uma mãe de Santa
Catarina, acompanhada de seu jovem filho, engenheiro, que estavam indo visitar
o outro filho, também engenheiro civil, que trabalha numa ONG no Alto Rio
Negro.
Um jovem seminarista, mineiro,
religiosos dos Missionários do Sagrado Coração, que estava indo para fazer uma
experiência de seis meses em terra de missão.
Um militar, voltando das férias e
retornando ao seu trabalho na Brigada das Selvas, Alguns funcionários públicos
e muitos moradores, na quase totalidade indígenas, que iam para Barcelos, Santa
Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira, os três únicos municípios desta
que é a diocese mais indígena do Brasil, evangelizados pelos salesianos, cuja
população é de 95% de várias etnias. Claro, e nós dois padres gaúchos, ambos
com experiência amazônica – um no Xingu, nos começos da transamazônica, e eu
com passagem em Roraima, no outro lado da linha do Equador.
O tempo foi sendo saboreado,
vivenciado com muitas conversas, contemplação da natureza. O Rio Negro, com
suas águas escuras, cheio, com suas correntezas que tínhamos que vencer. A
floresta, algumas povoações ribeirinhas de vez quando, e o inesquecível nascer
e pôr do sol, que contemplei na proa do barco, que me fez dizer como o Papa
Francisco: Louvado seja, meu Senhor!
E depois de trinta e duas horas,
vencemos a distância. Chegamos próximo da meia-noite, de lua cheia, no porto.
Apenas oito horas a mais do previsto!
E carinhosamente esperados e
acolhidos. Pena que o tempo foi curto para permanecermos ali. E a volta foi
apressada, nas asas de um táxi aéreo, que venceu esta distância em pouco menos
de duas horas e meia. Bendito o tempo que nos faz contemplar as maravilhas do
Criador!
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