terça-feira, 29 de maio de 2018

Crises


          O poeta canta que “faz escuro, mas vai amanhecer”. Falo nisso, porque vivemos em tempos de “crises”, em muitos lugares e países e em muitas instituições e grupos. Existe uma insatisfação muito grande em relação de como o mundo (política, economia) está sendo conduzido. Existe um clamor por mudanças, que agora ficou explícito no movimento dos caminhoneiros.
            O ser humano tem uma enorme capacidade de sair das crises e de superá-las. Aliás, a história nos ensina que foi nos tempos das piores crises que surgiram as maiores criatividades e soluções. O grande perigo é querer que a salvação venha por um “salvador da pátria” ou por soluções não democráticas e participativas
            Papa Francisco, no Encontro Mundial de Famílias, em Filadélfia, Estados Unidos, dizia que “a família é uma fábrica de esperança, de esperança e ressurreição. Deus abriu este caminho”. Ele nos dá sabedoria e força para também buscar as soluções.
Para Dom Walmor Oliveira de Azevedo, Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte, “a reflexão sobre as muitas crises que pesam, hoje, sobre os ombros da sociedade contemporânea, não pode deixar de considerar, seriamente, as crises institucionais, que têm um peso relevante no conjunto da história da humanidade, das sociedades e no interno das próprias instituições. Um peso que se calcula pelo passivo de atrasos, de desvirtuamentos na identidade, manipulação de finalidades, nos comprometimentos de propósitos e na condução das instituições para atender interesses pessoais e partidários. O desafio é enorme ao se ter em conta a importância capital de cada instituição, compondo o tecido dos segmentos da sociedade, na tarefa de se atingir metas e cumprir os compromissos prometidos – dever ético e moral.”
E continua: “Atravancadas e mal conduzidas, as instituições entram em crise, tornam-se pesadas, caras e se restringem a prestar um serviço medíocre. A sociedade é que paga o preço.   Por isso é urgente corrigir os rumos e procedimentos, alinhar fidelização a princípios, fazer escolhas de pessoas adequadas – superar protecionismos e apadrinhamentos – para tirar as instituições de suas crises.”
            Estamos em crise. Mas a crise maior não é a econômica, financeira, política... Esta é consequência da crise de valores e de opções, de escolhas e definições. Para onde caminha a humanidade? Que tipo de mundo nós queremos? Que família nós queremos construir e edificar? Que tipo de economia, de política, de nação, de cidadania, de educação, de Igrejas nós queremos?
            Estamos, sim, em crise, Mas não por causa do dólar, euro ou real. Por causa das pessoas, que não sabem para onde vão, por isso não conhecem o caminho. E se alguém não sabe para onde vai, qualquer caminho serve. A saída das crises depende das escolhas que fizermos. As crises oferecem possibilidades de mudanças que levam a novas formas de adaptação. Por isso, bem resolvidas, são positivas e necessárias. Sem ilusões e nem voltas ao passado. A saída da crise nos faz sempre olhar para frente.
      

quinta-feira, 24 de maio de 2018

A festa da Eucaristia


         Nossa vida está marcada por ritmos, datas, estações, festas e ritos... Assim também a liturgia assume esta cadência, celebrando e festejando. Quem dá o compasso são dois fatos, em torno do qual andamos: Natal e Páscoa.
            Em torno e a partir destes acontecimentos, vamos vivendo e celebrando. Como faz bem festejar e celebrar a Páscoa, com sua preparação e seu pós, que nos traz a Ascensão do Senhor (quarenta dias após), o Pentecostes (cinquenta dias após) e a celebração do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo – o Corpus Christi -, sessenta dias após a Páscoa do Senhor.
            Podemos dizer que a solenidade de Corpus Christi constitui um desdobramento da Quinta-feira Santa. Quer comemorar a presença de Cristo em sua Igreja como “Sacrifício Eucarístico de seu Corpo e Sangue, memorial de sua Morte e Ressurreição: sacramento de piedade, sinal de unidade, vínculo de caridade, banquete pascal, em Cristo nos é comunicado em alimento, o espírito é repleto de graça e nos é dado o penhor da futura glória” (Concílio Vaticano II, Constituição Sacrosantum Concilium, n. 47).
            Em cada Missa, após as palavras da narração da instituição da Eucaristia, o sacerdote exclama: “Eis o mistério da fé!” Sim, a Eucaristia celebra toda a fé cristã, todo o mistério de Cristo e da Igreja.
            Por isso, o mistério da Eucaristia é inesgotável. Poderia ser abordado de mil maneiras. Podemos enfoca-la, porem em dois aspectos: ela é ação de graças e Ceia do Senhor.
Ação de graças como sacrifício, pois se trata de um sacrifício memorial, de um sacrifício de ação de graças. Este aspecto expressa-se sobretudo pela Oração Eucarística. Nela a Igreja louva ao Pai pelas maravilhas realizadas por Cristo, no Espírito Santo. Em Deus Pai ela comemora sobretudo a obra da criação; em Cristo, a obra da redenção. E no Espírito Santo, a obra da santificação. Ela dá graças, isto é, louva, bendiz, agradece ao Pai. Comemora a obra do Filho e invoca o Espírito Santo para que a leve à perfeição.
Comemorando a obra sacrifical do Filho, ela a torna presente hoje, não mais de modo cruento, mas como sacrifício memorial. Na ação de graças, expressa-se a atitude sacrifical de Cristo e da Igreja. “Recordando, pois, a Morte e a Ressurreição de Cristo, nós vos oferecemos este sacrifício de vida e santidade”.
Vendo a Missa como Ceia do Senhor, consideramos mais as duas outras partes: a preparação das oferendas e a Comunhão. Aqui poderíamos considerar toda a riqueza de significado de uma ceia de amigos ou de uma ou de uma ceia fraterna, símbolo de encontro, de amizade, de felicidade, comunhão, aliança e compromisso, de intimidade e de confiança, de convívio e de vida, para só lembramos alguns aspectos da ceia fraterna.
Na Eucaristia, Deus mesmo se faz alimento. Ele realiza aquela aspiração mais profunda do ser humano de participar da vida divina. Na Eucaristia, Deus vem ao encontro desse desejo humano. Por isso, demos graças ao Senhor, nosso Deus! É nosso dever e nossa salvação!


           

sexta-feira, 18 de maio de 2018

Espírito Santo, a força de Deus

A festa do Divino Espírito Santo é celebrada cinquenta dias após a Páscoa – daí o nome de Pentecostes. Com ela se encerra a presença visível de Jesus no meio de seus amigos. Começa a missão dos apóstolos, que se abre para o futuro e continua sendo atualizada por muita gente que se compromete com Jesus.
É neste dia que, simbolicamente, se apaga o Círio Pascal, aceso na noite de Páscoa. É um gesto de muito valor, pois agora os batizados é que devem ser a presença visível do Senhor Ressuscitado no mundo e nas realidades.
Um ditado popular nos diz que “a corrente sempre arrebenta no elo mais fraco”. Em outras palavras: uma corrente só será forte se todos os elos estiverem inteiros, em boas condições. Isso vale para nós também. A harmonia de um conjunto pode ser rompida se um elemento estiver destoante, em conflito com os outros. As grandes empresas, voltadas para o lucro, também descobriram algo semelhante: há livros de gerenciamento de negócios ensinando que a empresa pode perder clientes se o mais simples vendedor passar uma impressão negativa ao freguês. Ninguém é insignificante ou pode ser ignorado quando queremos que uma equipe funcione, produza, dê bons resultados.
Isso se aplica a outros grupos: família, escola, Igreja... Não há técnica, recurso, projeto que substitua o bom relacionamento humano. Não há elemento mais valioso para o trabalho ou a vida de qualquer grupo do que as pessoas de que ele se compõe.
Uma religião pode ter magníficas doutrinas, cultos primorosos, leis admiráveis... mas o teste final de tudo isso será sempre o fruto produzido no relacionamento das pessoas, na construção da qualidade humana de cada um e da comunidade como um todo.
Pentecostes é a festa do aniversário da Igreja, que nasce na Páscoa e completa seu parto com a efusão do Espírito Santo sobre toda a comunidade reunida. O Espírito Santo é a alma, a força da Igreja. Sem ele não existe Igreja. Ele é a comunicação do Pai e do Filho.
Os elos da corrente da Igreja somos todos nós. Um elo sozinho não é corrente. Um cristão isolado ou separado não é Igreja. Quem nos une é a Palavra de Deus, a nossa fé, o Batismo. Quem nos dá força de vencer as fraquezas são os dos do Espírito Santo, que nos fazem frutificar e santificar o mundo e a Igreja.



terça-feira, 8 de maio de 2018

A mão de Deus une e liberta

              Atendendo ao desejo do próprio Jesus, que na oração sacerdotal (João 17), pede que ao Pai “para que sejam um como nós”, as Igrejas que fazem parte do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC), promovem a Semana de Oração pela Unidade Cristã, de 13 a 20 de maio, semana entre a Ascensão do Senhor aos Céus e o Pentecostes.
            O tema escolhido para este ano vem das Igrejas do Caribe e nos convidam a refletir sobre a presença de Deus, guiando, sustentando e libertando nossos povos. O lema está inspirado no texto do Êxodo capítulo 15, a partir do canto de Miriam e Moisés: A mão de Deus nos une e liberta.
            A contínua esperança e coragem que Deus deu aos hebreus continua a trazer esperança a todos os povos. E cada vez mais é necessário somar forças, dar testemunho, trabalhar juntos para prestar solidariedade a todos os necessitados, principalmente aos mais vulneráveis.
            Na apresentação dos subsídios para a Semana de Oração, os dirigentes do CONIC afirmam “que Deus é Deus de libertação. No Êxodo vemos como Ele não aceitou a escravidão do povo hebreu pelo Egito. Deus ouviu o clamor e solidarizou-se com o sofrimento do seu povo escravizado. A sua solidariedade foi política no sentido de desafiar as pessoas escravizadas a se organizarem para a libertação. A mão de Deus não foi assistencialista, nem foi conformista. Ela movimentou as pessoas para se unirem e se organizarem para sair da dominação a que estavam submetidas.”
            E continuam nossos dirigentes do Conselho de Igrejas Cristãs: “Muitas vezes pensamos que o trabalho escravo é algo que pertence ao passado. Infelizmente, isso não é verdade. O trabalho escravo ainda hoje é realidade. No ano de 2017, lemos nos ornais sobre o leilão de pessoas refugiadas como escravas realizado na Líbia. No Brasil, o trabalho escravo não findou com a Lei Áurea. Ainda hoje são descobertas pessoas obrigadas a se submeterem a condições de trabalho análogas à escravidão. Em 20127, foi publicada a Portaria MTB No. 1129 que alterou as regras que combatiam o trabalho escravo. Segundo a Portaria, para poder caracterizar um trabalho como análogo à escravidão, é necessário que a pessoa tenha reduzido o seu direito de ir e vir. As demais variáveis presentes em um trabalho análogo à escravidão, sozinhas, não são mais considerados elementos suficientes para caracterizar o trabalho escravo, entre elas: trabalho forçado, jornada exaustiva e condições degradantes.”
            O tema da Semana de Oração pela Unidade nos desafia e desacomoda. Ele tira o véu de realidades escondidas, invisibilidades e que nos incomodam. A fé em Jesus Cristo e seu Reino abre nossos olhos para o sofrimento dos irmãos e irmãs provocando-nos a sair da indiferença. A nossa fé cristã nos desacomoda, pois exige que não compactuemos com os projetos que querem continuar exercendo poder e definindo que algumas pessoas serão sacrificadas para que outras vivam em abundância.
            A Semana de Oração pela Unidade Cristã fortalece a nossa comunhão para a edificação do Reino de Deus e sua justiça.



             

quinta-feira, 3 de maio de 2018

DNA de Deus


Todos nós temos o DNA de Deus. Deus é amor e nós devemos viver o amor.

            Certas vidas são tão impressionantes que são admiradas até por quem tem outras crenças ou outra cultura. Assim, por exemplo, São Francisco de Assis, que foi escolhido como homem do milênio, e a escolha foi aprovada por católicos, evangélicos e não cristãos. O exemplo desse homem ultrapassou o seu grupo religioso. O mesmo acontece com Gandhi, um hindu que serviu de inspiração para o cristão Martin Luther King, pastor batista, no seu projeto de defesa da igualdade de direitos para brancos e negros nos Estados Unidos. Luther King dizia que seu ideal de conquista pacífica dos almejados direitos se inspirava na doutrina de Jesus e na metodologia de Gandhi. Atues admiram a religiosa, agora canonizada, Madre Teresa de Calcutá e o valente e caridoso D. Hélder Câmara. Cristãos citam com respeito a luta de gente que até nem acredita em Deus mas trabalha por um mundo melhor, nas artes, na política, na sua profissão ou na comunidade.
            O que todos esses têm em comum e ultrapassa as fronteiras dos povos e religiões é o amor ao próximo, à verdade, aos direitos humanos, à justiça. Esse é um valor indiscutível e primordial para os seres humanos. Para Deus também.
            O amor é a essência do cristianismo e o testemunho mais potente que um cristão pode dar. São João, na sua Primeira Carta, fala que Devemos nos amar uns aos outros, pois o amor é de Deus e todo aquele que ama nasceu de Deus e conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é Amor (1 Jo 4,7-8). Com isso afirmamos que o DNA de Deus é o amor. E esse DNA está presente estruturalmente, intrinsicamente, em cada “célula” dos seres humanos, em nossa vida. É o amor que nos distingue como filhos e filhas desse Pai. O amor do Pai é a “prova”, o “teste” que garante: somos chamados filhos de Deus. E nós o somos!
            O amor nunca é pra si mesmo. Sempre é doação. Ser amado leva a amar. No Evangelho, Jesus sempre fala do amor em rede: podemos amar porque somos amados; Ele nos ama como o Pai O amou; nós somos convidados a amar os outros como Ele nos ama. É como uma fonte que vem do Pai, passa por Jesus, chega à comunidade, satisfaz nossas necessidades e deve ir aos outros.
            O amor que Jesus nos pede é parecido com o dele: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. Ele não diz “amem-me porque eu amei vocês”. A retribuição que ele quer não é para ele: é para oferecer aos outros.
            Esse amor é uma grande notícia a ser espalhada. Jesus nos oferece esse amor “para que a sua alegria esteja em nós e a nossa alegria seja completa” (Jo 15,11). Esse amor, visível, circulante é motivo de alegria, impressionava quem conhecia as primeiras comunidades: “Vejam como eles se ama”.